Novo parecer emitido pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPC-ES) no processo que trata do Complexo de Saúde do Norte do Estado reforça as irregularidades na execução da obra e pede ao Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCE-ES) que reconheça a gravidade delas e determine ao Departamento de Edificações e de Rodovias do Espírito Santo (DER-ES) a adoção de medidas corretivas imediatas.
O órgão ministerial diverge parcialmente do posicionamento do Núcleo de Controle Externo de Edificações (NED), que reconhece as irregularidades, mas considera que elas foram sanadas ao longo da análise processual.
Para o MPC-ES, as falhas são graves e merecem ser respondidas individualmente, por meio da elaboração de matriz de responsabilidade e citação dos responsáveis. Entre as irregularidades apontadas estão: redução da área construída em mais de 16%, resultando em suposto prejuízo superior a R$ 34 milhões aos cofres públicos; ausência de fiscalização no local da obra; falta de planilha orçamentária para garantir a correspondência entre os pagamentos e os serviços executados; ausência de projeto básico completo; e prática ilegal de antecipação de pagamentos por serviços não realizados.
O processo 1092/2023 tramita no Tribunal de Contas desde março de 2023 e como se trata de um acompanhamento, o MPC-ES reconhece que o objetivo principal desse tipo de processo não é punitivo, tampouco visa responsabilização por impropriedades ou irregularidades.
“Entretanto, se, durante a realização da fiscalização, o trabalho adquirir esses contornos, é viável que se proponha (i) o aprofundamento do exame das irregularidades no próprio processo de Acompanhamento ou (ii) a realização de outra ação de controle com vistas a concluir a análise dos achados identificados”. (Trecho do Parecer do MPC-ES 01272/2025-9)
Por isso, o MPC-ES pede a reabertura da instrução processual para apurar as responsabilidades individuais dos envolvidos nas irregularidades, com base em critérios de reprovabilidade da conduta e potencial lesivo para a Administração Pública. Alternativamente, caso o Tribunal entenda que não cabe a individualização no processo de acompanhamento, que seja autuada uma Representação contra o DER-ES e o Consórcio Complexo de Saúde Norte.
Pedidos do MPC-ES
No parecer anterior, emitido em junho de 2024, o órgão ministerial pediu que a empresa contratada para fiscalização verificasse a qualidade e quantidade dos serviços executados, garantindo que os pagamentos fossem compatíveis com o anteprojeto, projeto básico e normas técnicas, além de garantir que os pagamentos futuros considerassem a área construída real e que eventuais valores pagos indevidamente fossem estornados.
Também foi orientado ao DER-ES que não antecipasse pagamentos, sem que houvesse previsão contratual e sem garantias efetivas para o caso de não execução do serviço, e que fosse exigido o projeto básico completo e planilha orçamentária antes de autorizar novos pagamentos.
Foi recomendado, ainda, que o DER-ES adotasse medidas preventivas para fiscalizar todas as etapas da obra, assegurando que os serviços atendam às especificações e que os pagamentos correspondam ao serviço executado, com base na planilha de pagamentos do contrato e na planilha orçamentária.
Novos pedidos
Agora, o MPC-ES acrescentou aos pedidos que o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), responsável pela destinação de recursos para a obra, seja notificado sobre as irregularidades e as medidas pertinentes.
Além de pedir a reabertura da instrução processual, com a individualização das responsabilidades, ou a autuação de uma representação para isso, o órgão ministerial pediu que o caso seja julgado em sessão presencial, visando dar a máxima transparência ao assunto, bem como seja estabelecido prazo de 90 dias ao DER-ES para que encaminhe à Corte de Contas a comprovação das providências e garantia da regularidade dos pagamentos e da execução da obra.
Histórico do processo
O Complexo de Saúde vai abrigar o novo Hospital Roberto Arnizaut Silvares, a Superintendência Regional de Saúde, o Centro Regional de Especialidades, a Farmácia Cidadã e o Hemocentro Regional. Sua construção está prevista no Contrato 86/2022, celebrado entre o DER-ES e o Consórcio Complexo de Saúde Norte, constituído pelas empresas Infracon Engenharia e Comércio Ltda, líder do consórcio, GND Construções Ltda e CCG Construções Ltda, e tem previsão de conclusão em novembro de 2025, com valor total de R$ 263 milhões. A obra será custeada com recursos dos orçamentos da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) referentes aos exercícios de 2022 a 2025.
Após analisar a documentação apresentada pelo diretor-geral do DER-ES, em 2024, em resposta às irregularidades apontadas no relatório de acompanhamento, o NED constatou que a argumentação não se alinhava com as recomendações da equipe técnica e sugeriu a oitiva formal do DER-ES e do consórcio responsável, concedendo 30 dias para suas defesas.
A argumentação dos responsáveis ganhou o endosso do NED, embora nada de novo tenha sido revelado. O órgão ministerial ressaltou ainda o fato de que não foi encontrado alinhamento nas documentações e que a argumentação de defesa visava apenas descaracterizar os achados do Relatório de Acompanhamento e refutar as determinações propostas.
O NED concluiu ainda que as irregularidades identificadas haviam sido sanadas e recomendou apenas dar ciência ao gestor do DER-ES dos achados de auditoria com a finalidade de prevenir situações similares. O processo foi, então, encaminhado ao MPC-ES, que divergiu da equipe técnica, pois, mesmo com a abertura do contraditório, por meio da oitiva formal dos envolvidos, as justificativas do DER-ES e do consórcio Complexo de Saúde Norte foram insuficientes para minimizar ou afastar a gravidade das irregularidades.
Após emissão do segundo parecer ministerial, no último dia 31, o Processo 1092/2023 foi enviado ao gabinete do conselheiro Rodrigo Coelho do Carmo, relator do caso, para elaboração de voto. Ainda não há data prevista para julgamento.